quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

O disparate da hiperactividade infantil

Ainda não tinha chegado aos meus ouvidos esta questão, até ler, há já algum tempo, o excelente livro “Os Inventores de Doenças” (ed. Ambar), do jornalista científico alemão Jorg Blech. Nele, o autor explica como o termo foi criado e difundido pela classe médica, com finalidade de vender um novo medicamento, destinado aos meninos irrequietos - que começavam assim a sua vida escolar drogados ou medicados (escolham a expressão que preferirem).

Recentemente, soube que a tal hiperactividade pode estar ligada a corantes e outros aditivos alimentares, muitos deles presentes nos doces que com demasiada regularidade os pais compram às criancinhas.

Creio que a questão é mais profunda que isto. Não se resume a tramóias da indústria farmacêutica ou a aditivos alimentares (que há sempre que evitar - e as drogas da indústria, idem).

Recentemente voltei a ver um vídeo sobre educação e criatividade, agora com legendas (da vez anterior tinham-me escapado muitas coisas!), e voltei a repensar o assunto.

O que se passa é que hoje, muitos pais, querem crianças domesticadas, que não chateiem, que não se sujem, que não corram riscos (mesmo que mínimos). Pretende-se um macaquinho de colocar na estante para mostrar aos amigos (e nessa altura poderá mostrar algumas habilidades, previamente aprovadas pelos pais). Daí que muitos pais comprem aos meninos o que podem e não podem para os manterem caladinhos, que uma birra é coisa insuportável e os papás não estão para isso. Concluindo: hoje pretende-se que as crianças não chateiem. Ponto. Sem que para isso lhes seja dada educação em casa, claro está.

Po outro lado, as crianças raramente podem gastar toda a energia que têm de forma espontânea: ele é a aula de ballet, ele é o inglês, a informática, os tempos-livres-em-que-metem-o-menino-em-frente-ao-televisor, etc, etc. E, em casa, os jogos de computador ou da consola (que os papás deram ao menino para que se calasse). Não saem à rua (que é perigoso!), e quando andam de bicicleta mais parecem uns astronautas, com tanta parafernália protectora. Ou seja, não são crianças, não se sujam, não gritam e correm e saltam e rebolam. NÃO! Calma, crianças!

Como se pretende que estas crianças que, como qualquer criança, têm uma energia brutal, prestem atenção em mais um sítio - escola - em que têm de estar quietinhas? Se não lhes permitimos expressar essa energia, descobrir-se a si próprias, ter momentos de evasão, extravasar-se - dando-lhes momentos próprios para isso - como podemos esperar que se consigam concentrar e aprender?

Há ainda situações, como a referida por Sir Ken Robinson no video, em que as crianças são boas em tudo o que se relacione com expressão corporal - dansa, teatro... - e, nesse caso, não há volta a dar: há que matriculá-las numa escola que corresponda aos seus anseios! O caso que ele refere é muitíssimo relevante: a criança que foi levada a um "especialista" (felizmente com muita sensibilidade) com problemas de aprendizagem não está "doente" (e na altura ainda não se falava na hiperactividade, como muito bem lembra Robinson), é uma "bailarina" - de facto, teve imenso sucesso como coreógrafa de Cats e outros musicais famosos. Outro "especialista" tê-la-ia medicado e a criança iria para a escola todos os dias meio zombie, e hoje seria, provavelmente, uma anónima e anódina trabalhadora de uma qualquer empresa. Em vez de uma mulher pleamente realizada, que até é milionária à custa do seu trabalho.

Mas é mais fácil, a curto prazo, dar-lhes Ritalina (drogá-las com Ritalina, melhor dizendo), e pactuar com a situação de o menino ter de tomar o comprimido todos os dias. Isto é um crime!

Entretanto, toda a sociedade aceita que as criancinhas devem ser controladas, devem ser "mansinhas" (não estou a falar em educação, é outra coisa e compete aos pais), daí que os professores/escolas já peçam aos pais dos petizes mais irrequietos que lhes dêm a pílula mágica - se existe, para que serve?, se não para acalmar aqueles diabretes irrequietos?

1 comentário:

  1. Não sei se a hiperactividade existe ou se resultou de mais uma criaçao científica para arrumar ideias, tal como a fibromialgia. Mas a verdade é que há muitas diferenças entre uma simples criança irrequieta e uma criança com suposta hiperactividade. E só quem nunca lidou com estas crianças é que pode dizer que elas são simplesmente criancinhas irrequietas, fruto da domesticação sem sucesso dos pais e da sociedade. Experimentem passar uma semana com estas crianças, ter uma delas numa sala de aula para rapidamente bradarem aos céus pela pílula mágica que as faça sossegar e ficar atentas. O comportamento que estas crianças apresentam é, de facto, patológico porque as impede de aprender e progredir, ao contrário da criança irrequieta que se torna um anjinho à primeira bofetada ou cara ameçadora. É necessário tratamento e intervenção comportamental... se o ideal é este ou aquele comprimido, psicoterapia, exercício físico provavelmente ainda ninguém sabe porque a história da "doença" é recente. Agora que estas crianças são diferentes, isso não há a menor dúvida e este tipo de posts não ajuda em nada a evolução no conhecimento desta alteração, patologia, doença, o que lhe queiram chamar.

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